Wednesday, March 07, 2007

Delírios de uma brasileira com saudade de casa

Não sei quanta gente sabe, mas sou apaixonada pelo Cirque Du Soleil.
Brian garante que quem viu um viu todos, mas eu discordo e, toda vez que há uma chance, lá estamos nós.
Não gosto dos circos do meu tempo de infância porque não acho graça em animais amestrados.
Sou do tempo o Orlando Orfei e coisas assim, geralmente na Praça Onze, no Rio.

Aqui nos EUA já assisti La Nouba duas vezes, Varekai, Corteo e ontem, Delirium.
Sabendo que Delirium seria diferente dos tradicionais espetáculos do circo, preferi não levar o Nicholas.
Delirium é mais um concerto, tem muitos recursos techno, tanto no som quanto nas imagens que são projetadas em dois telões e na fina cortina que em vários momentos do espetáculo separa o palco da platéia.
Pelo que vi no trailler do site, deu pra perceber que a proposta era outra.

Uma grande bola flutua durante a apresentação. Presa a ela um artista, que é o personagem que sonha.
No sonho, os elementos da natureza... tem água, fogo, terra, ar... Há personagens absurdos no sonho, eles se misturam com as imagens projetadas e aparecem como imagens também, a ponto de haver momentos em que você não tem certeza se o que vê nas telas é a imagem de quem está no palco ou imagens previamente gravadas. Música ao vivo.
O nome do espetáculo não poderia ser mais apropriado. Até o personagem principal, num momento do show, olha pra platéia e diz algo semelhante a: “Ainda bem que isso aqui é um sonho, pois é tudo muito esquisito.”
E é.
Mas é bom!
Não é tão bom quanto os outros espetáculos que eu já assisti. Pro meu gosto, os outros são melhores e pelo que já li, bons mesmo nem são os espetáculos itinerantes do Circo, mas os que têm seu local fixo, como La Nouba, em Downtown Disney (Orlando, FL), os de Las Vegas e do Canadá.

Até aí, novidade nenhuma. A essa altura já deve ter alguém se perguntando o que me teria feito escrever esse lero-lero todo pra contar a experiência.
Bem, na verdade, eu me surpreendi ao me deparar, aos primeiros acordes do espetáculo, com uns timbaleiros de primeira. O show começa e termina com música nossa. Nenhuma música conhecida, mas o ritmo é nosso, brasileiro, música cantada em Português, sim. Também não posso garantir que os caras que tocavam sejam brasileiros, ainda que fisicamente haja uma chance enorme, mas não consegui investigar pra saber... Teve percussão da boa, cuíca e tudo!
Quem poderia imaginar?Março em Wisconsin, eu na cidade de Madison com neve pra todo lado, um frio de rachar e de repente começo a ouvir Timbalada?
Meu corpo levou um tranco!
E eu que nunca gostei de timbalada... Não que detestasse, mas nunca liguei, nunca me disse nada...
Mas ouvir timbalada fora de casa não é a mesma coisa. E se eu pudesse teria levantado, subido na cadeira e dançado junto.
Durante o show, mais duas músicas em Português. Desta vez cantadas por dois americanos, que se esforçaram pra disfarçar o sotaque, sem muito sucesso. Amei! Eu que sou a que fala com sotaque... Ouvir sotaque alheio é a hora da vingança!
Uma das músicas tinha uma qualquer coisa de bossa nova, de leve... uma delícia! O show se encerra com outra música em Português e um pessoal meio desarranjado querendo acompanhar o ritmo.
Quem assistia estava achando o máximo...
Eu sabia que eles eram desarranjados. Bons em malabarismos e coisas assim, mas completamente desencontrados pra dar conta do nosso ritmo. Não adianta... Eles simplesmente não conseguem.
Sambar é mais difícil do que qualquer uma daquelas travessuras que eles fazem. Eu falo de cadeira, porque também não sambo nada... mas sei identificar quem samba direito.
Como valeu ter visto coisa nossa num espetáculo tão grandioso, principalmente porque eu não esperava encontrar o que encontrei.
A gente passa ao largo de uma série de coisas que fazem parte do que faz o país da gente ser o que é quando tudo isso pertence ao lugar comum. Muda-se o contexto, o olhar, a saudade e as coisas passam a ter um significado completamente diferente.

É óbvio que eu poderia comprar um CD com música baiana, ouvir Timbalada em discos de uma série de cantores... mas não é isso.
Ter sido descontextualizado trouxe uma surpresa que deu uma saudade enorme de casa.
Voltando pra casa, vim ouvindo Ana Carolina, Chico, Elba num dos meus CDs malucos onde tem de tudo um pouco.
É... É saudade de casa!
Malabarismo eu também faço... encarando este invernão que nunca que acaba, desta vez sem saber quando vou poder ir ao Rio...
Numa das músicas em Português que eles cantaram, uma palavra a gente entendia bem: ALEGRIA.
É isso. Alegria é coisa muito nossa!
Enfim...

Perguntas do Nicholas

Era uma tarde qualquer deste inverno maldito que nunca acaba.
Havíamos chegado da escola e a correria pra preparar o jantar já havia começado.
Eu ia fazer peito de frango à milanesa e junto com a tábua de carne estava um martelo de bater bifes, a faca pra cortar os peitos de frango e os peitos de frango.
Corta daqui, tempera dali, marreta de cá.
Nicholas vem correndo lá da sala, olha pra mim espantado e pergunta:
- Mamãe, por que você está matando a comida?